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Por Heloisa Facin e Victor Sena

O comércio informal e a

Copa do Mundo 

 

A 2.190 quilômetros do estádio Castelão, em Fortaleza (CE), onde o Brasil jogava sua segunda partida na Copa do Mundo de 2014, e a 52 quilômetros do Maracanã, estádio que receberá as seleções na final do campeonato, o comércio informal de camisas, cornetas, chapéus, bandeiras pintava de verde e amarelo as margens da rodovia BR-465, a antiga Rio-São Paulo, no centro do município de Seropédica (RJ). As barracas de camelôs e os ambulantes são marca registrada dos espaços próximos à pista. Alguns, aproveitando a vontade dos brasileiros de se cobrir com as cores do país, de camisas do jogador Neymar e de fazer barulho na hora do jogo, trocaram seus produtos tradicionais por outros que têm mais chance de vender em tempos de a seleção brasileira jogando em casa. 

 

O dia era 17 de abril de 2014. O sol forte e o corre-corre no centro de Seropédica, conhecido como "KM 49", era umas das características da terça-feira em que o Brasil, para uma frustração geral, empataria em um 0x0 com o México, no estádio do Castelão. Carros passando com bandeiras, filas nos supermercados com estudantes da universidade federal, que fica na cidade, barulho de cornetas. Uma pressa estava no ar. Mas, se muitos estavam correndo, no início da tarde, para deixar tudo pronto até a hora do jogo, às 17h, outros ficavam onde estavam, esperando fregueses, com a televisão já posicionada e as camisas do Neymar, com um grande número 10 nas costas, balançando ao vento. Eram vendedores informais que, mesmo em hora de jogo, não desmontariam suas barracas. Porque sempre haveria um ou outro esquecido que deixou para comprar algum amuleto verde e amarelo em cima da hora.

 

Thiago Miguel, 23 anos, apostava nas camisas como principal produto de sua barraca. Morador de Seropédica, acompanhado do irmão mais novo, é a primeira vez que vende produtos relacionados à Copa. Desde 2012 no local, Thiago vendia, antes de o Mundial começar, DVDs e acessórios para celulares. No dia do primeiro jogo do Brasil, 12 de junho, ele, o irmão e sua barraca se vestiram de verde e amarelo. Era o que os clientes queriam.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Thiago assistiu o jogo na televisão de um outro vendedor, que tem acesso à rede elétrica e compartilhou a tela.

 

 Cara, eu sou muito bom de assistir futebol, mas de jogar, não sou bom, não. Meu irmão joga mais  disse.  Na semana que vem, se o Brasil ganhar, espero que o movimento seja melhor. O lucro está sendo bom, comparado com os DVDs que eu vendia antes.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A Copa no Brasil: tão perto, tão longe

 

Thiago compra seus produtos de outros vendedores na cidade do Rio de Janeiro. Na barraca dele, a camisa mais barata custa R$ 20. A mais cara, R$ 65. Para o vendedor, se por um lado, a Copa o ajudou em algumas coisas, como nas vendas, por outro, evidenciou que ainda temos muitos problemas, como a falta de investimento público em áreas que o país ainda tem precariedade:

 

 Eu tenho que sair daqui de noite, dormir no centro do Rio e acordar cedo lá para levar meu filho ao Hospital. O trânsito no começo da manhã é muito ruim e não dá para sair daqui direto. 

 

Os vendedores são pessoas simples, que vivem a Copa de 2014 a distância, apesar de ela estar em solo brasileiro. Muitos jogos são no estádio do Maracanã, no Rio, mas é na TV de um dos vendedores que eles são vistos. Anderson Oliveira é um dos que aproveitam para assistir o jogo nela enquanto vende. De um lado, a tela. No meio, a barraca. E, do outro lado, o ajudante de vendas faz um churrasco... 

Anderson, que tem 33 anos, trabalha no comércio informal desde 1994, quando vivenciou sua primeira Copa na venda. Na época, ele ajudava outros comerciantes a vender produtos temáticos do campeonato, e no Mundial seguinte já era seu próprio patrão. Anderson acredita que o sentimento do brasileiro em relação à Copa tenha mudado um pouco. Segundo ele, apesar de o futebol ser a paixão do país, parte da população está descontente com a forma como o evento foi organizado. Mas, no fim das contas, conclui:

 

 — O brasileiro gosta mesmo é de uma boa festa com churrasco, então o clima de festa na Copa deixa tudo mais tranquilo de novo. 

 

O vendedor — que no dia 17, data do jogo entre Brasil e México, estava todo vestido em espírito da Copa, com chápeu, blusa e bermuda temática do mundial — também trabalha com telefonia celular durante os outros meses do ano. Mas explica que, para as vendas serem boas, depende do envolvimento da população e da fase do mundial. Para Anderson, o movimento está sintonizado com Seropédica, ou seja, em ritmo de cidade pequena. 

 

— Só não vendi a minha mãe e a irmã porque já levaram — disse o vendedor, com uma malandragem e bom humor caricatos. — É de acordo com o clima do jogo. Semana passada tava de um jeito, essa semana  de outro. Tudo depende do momento da Copa. Normalmente, a segunda fase é melhor para o comércio. Mas  legal, tranquilo, todo mundo vendendo, na paz — explica Anderson.

 

O vendedor, animado, faz uma demonstração com o repórter Victor Sena, no vídeo abaixo, da estratégia utilizada para conquistar clientes em sua barraca. 

Comércio regado

a futebol e churrasco

 

Todos os produtos são comprados na capital ou entregues por fornecedores, para que sejam revendidos aqui, em Seropédica, nas barracas. Anderson afirma que a venda dos produtos com o tema da Copa ajudam a melhorar muito o comércio, o que oferece um incremento para a renda mensal nos meses do campeonato.

 

Mas, tudo depende da atuação da seleção no mundial. Se eles vão bem, os vendedores também vão. Mas, se fizerem uma competição ruim, os informais perdem muito nas vendas, e os produtos acabam ficando estocados, causando bastante prejuízo.

 

— Se não vender agora, só daqui a quatro anos! — destaca — Aí, é torcer para o Neymar ser convocado na próxima Copa, para que a gente consiga passar o produto guardado adiante. Tenho muitas camisetas do Luís Fabiano, do Kaká e Ronaldinho estocadas das últimas Copas. Eu e minha esposa acabamos doando algumas para as crianças mais carentes.

 

Anderson também fala um pouco sobre o seu movimento no dia do jogo Brasil x México:

Na barraca do vendedor, entre conversas e risos, os clientes se aproximavam interessados nos produtos e no bom humor dos comerciantes. Entre eles, estava a empresária Bruna Santos, de 25 anos, procurando por bandanas para si e para seu cachorro. Uma das ajudantes de vendas da barraca apresentava todos os produtos para que Bruna pudesse escolher as melhores opções. 

 

Quando questionada sobre o que mais lhe atrai na Copa, ela surpreende:

Com os produtos pendurados bem próximos à rodovia — onde muitos caminhões passam, no conhecido trânsito ruim da Estrada Rio-São Paulo, que liga a Avenida Brasil à rodovia federal Presidente Dutra (BR-116) — a barraca de Lindineia Deodoro resiste. E ela também, enquanto vende. De quatro em quatro anos, a cada Copa do Mundo, “há quase 30 anos”. 

 

 Tem muito concorrente, e a aí o pessoal se espalha. Aqui é uma cidade pequena, que não tem indústria, não tem emprego  disse a vendedora, moradora de Seropédica, nos intervalos do Mundial, vende capinhas para celular.

 

Duas semanas antes do início da Copa, Lindineia já tinha deixado sua barraca verde e amarela, mas o movimento não tem sido forte.

 

 A história mais engraçada foi quando um cara veio comprar uma coisa para a mulher e depois comprou para a amante. Comprou a mesma coisa, uma camiseta — disse Lindineia, aos risos. 

 

 

"Camisa para a amante", 

fogos e um palpite otimista

 

Lindineia Deodoro vende produtos do Brasil

sempre que tem Copa

O comércio informal é comum no centro de Seropédica. No espaço, conhecido como "camelódromo" do KM 49, em que os vendedores informais de produtos da Copa estão, há cerca de 10 barracas, segundo a prefeitura municipal. Todos são cadastrados e a Secretaria de Receita da cidade está notificando todos os comerciantes informais para se tornarem microempreendedores individuais, na Receita Federal.

 

— Enquanto os vendedores que tradicionalemente estavam lá não se formalizam, a Prefeitura fornece um alvará provisório de utilização do espaço, o Título Precária, e cobra uma taxa anual para utilização — disse Sérgio Henrique da Paixão, diretor de tributação do município.

 

Medido desde 2007 pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), junto ao Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), o  Índice de Economia Subterrânea (IES), que observa o comércio informou atingiua marca de 15,9%. Em dinheiro, isso significa R$ 760 bilhões movimentados no país.

 

Um pouco mais afastado das barracas de camisetas que a Prefeitura tem os cadastros, José Luís Japão, 45 anos, morador de Seropédica, vendia fogos, bombinhas, e seu colega atraía os clientes com bandeiras e bandanas. Os dois usavam bandeiras do Brasil como capas, parecendo super heróis de verde e amarelo.

 

— Com a Copa, está surgindo muito dinheiro para o Brasil. Aqui, para mim, ele não está chegando muito, não. Mas bom — disse Japão, que tinha começado a vender as bombinhas naquele dia. — saindo muitos fogos e bandeiras.

 

Como a maioria dos brasileiros, a aposta do vendedor era para que o Brasil ganhasse o jogo do dia contra o México. O seu palpite de 2x1 sobre o outro time não se realizaria. Uma hora e meia mais tarde, um 0x0 desanimador encerrou a partida.

 

Quatro horas depois de armar sua barraca de bombinhas, José Luís conseguiu R$ 200. 

"Com pressão ou

sem pressão?"

 

Assim é a abordagem do vendedor ambulante João Antonio Avelino Bruno, de 56 anos, que, com muito ânimo e vitalidade, vestido dos pés à cabeça de verde e amarelo, vende seu amendoim há 28 anos na cidade. Segundo Bruno, como gosta de ser chamado, as vendas com a chegada da Copa do Mundo melhoraram muito. No entanto, ele reforça que seu amendoim tem tradição no local e sempre fez muito sucesso. O seu bordão para atrair os clientes é: com pressão (o amendoim com casca) ou sem pressão (opção sem casca).

 

— Eu vendo 50 kg por semana desse amendoim, rapaz! Trago tudo do centro do Rio, lá do Ceasa. Eu arrebento! — comemora o vendedor — E aí, como vai querer o seu? Com pressão ou sem pressão? — pergunta Bruno.

 

 

Expediente

 

Heloisa Facin é estudante de Jornalismo na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

 

 

 

Contato: helo_facin@yahoo.com.br

@helofacin

facebook.com/heloisafacin

Victor Sena é estudante de Jornalismo na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 

 

 

 

Contato: vsenasouza@gmail.com

@senavictor

facebook.com/senavictor

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